Sábado recebemos um convite interessante, assistir a final do hochey masculino nas olimpíadas de inverno na casa de um amigo de trabalho do marido. Apoiei a ideia e marido se animou.

O jogo era as 7 horas da manhã, 10 pessoas já haviam confirmado que iriam, e a ideia era tomar café da manhã na casa dele assistindo o jogo. Que coragem acordar cedo em pleno domingo pra assistir um jogo, mas gente, eu não podia deixar de curtir essa experiência, não é?

Reloginho tocou as 6 da madruga, chamamos um taxi, enrolamos nossos quitutes matinais num pano de prato num bom estilo colatinense de ser e lá fomos nós.

A experiencia me fez pensar na copa, que saudade de torcer em família e ouvir os gritos dos vizinhos e a criançada na rua... tá vai, difícil fazer isso aqui ainda mais em fevereiro, com esse frio vortexante de congelar as juntas, mas que dá saudade, ahhh dá!

O canadense é muito educado, muito do tipo muito mesmo, daqueles que se você pisar no pé dele ele vai te pedir desculpa por ter deixado o pé ali... é lindo de se ver. Mas na hora do jogo, no jogo de hockey, a paixão nacional desse país, a educação, ó meu Deus, o que acontece com toda aquela educação?


Continua lá, sem tirar nem por, íntegra.

Jogo rolando, jogadores patinando, caindo e se trombando, tempo correndo, final do hockey nas olimpíadas, valendo ouro!

E a torcida?

A torcida ali naquela sala não grita, não chora, não xinga quando aquela falta acontece.

Gooooool!!!!!

Gente, vamos nos abraçar, vamos gritar, Hi Five aqui colega, foi gol!!!  - ahhh sim, aquele disco quando entra na travinha se diz gol também; Mas não, nada de euforia, nada de ninguém indo gritar gol na janela para os vizinhos ouvirem  - bom, nesse caso a gente até entende porque... Cadê a algazarra, não tem a vuvuzela nem a cachirola, num tem nem nome folclórico para a bola o disco. Esse povo não xinga o juiz, nem a mãe dele. Esse povo é muito contido, polido, educado, refinado... Decidi ficar educadinha também, sabe? Primeiro pra não destoar do grupo, segundo porque eu só tinha certeza do gol no repeteco, efeito retardado num dava, né? Ô coisa difícil é ver aquele disco entrando na trave no meio daquela confusão...




Bom, daí aconteceu o intervalo, e eles se levantaram e foram pra mesa tomar o café da manhã, porque até então estavam todos com apenas o copo de café na mão olhando concentrados para a tela da tv, quase que sem respirar... na mesa de café tinham frutas, um pãozinho recheado com alguma coisa doce, um bolo de milho maravilhoso, bagel torrados com cream cheese, ovos e claro e obviamente, bacon.

Eu não sou muito boa na cozinha, mas bem, café da manhã né, lá vamos pensar no que fazer. Podia ter ido ao mercado e comprado uns biscoitos, ou um muffins, ou qualquer outra coisinha já PRONTA, mas não, fui eu pra cozinha, seguir a receita de bolo de milho ao pé da letra - sim, o bolo de milho maravilhoso era brazuca - segui cada graminha de farinha de trigo para não dar errado e levar uma coisinha especial e receita brasileira, pensando que isso seria um grande feito, adorado e aclamado pela multidão.

Preparamos o bolo na noite anterior, e quando o alarme do forno tocou, fomos lá... e que puxa, como cresceu, tá douradinho e cheiroso, e que alegria, deu tudo certo! Certeza que foi a ajuda do marido que fez o bolo ficar bom assim, afinal foi ele quem bateu todos os ingredientes, eu só medi as colheradas de trigo. Mão boa pra cozinha tem esse homem, o bolo ficou ótimo, devia fazer bolinhos e comidinhas mais vezes #ficaadica...

Mas voltando ao assunto do café da manhã e deixando os apelos culinários ao marido pra outra hora, a mesa estava posta, intervalo de jogo, hora de tomar o café da manhã e nós estávamos prontos para receber os elogios. O primeiro se levantou, pegou um pãozinho, um bagel, um pouco de ovo, um bacon e se sentou. Foi o outro, e o outro, e o outro, e o outro... a pilhas de ovos mexidos e bacon foram diminuindo, diminuindo... e o bolo, ninguém comia.

Eu é que não iria ficar só olhando para aquele bolo lindo ali, né? Comi 2 fatias, marido comeu 2 também, e o dono da casa (acho que pra não fazer desfeita) comeu um também. No final, não havia mais ovo nem bacon, mas o maravilhoso bolo de milho tinham sobrado mais da metade, o que não estava lá, tinha sido comido por mim e pelo marido. Eu fiquei olhando aquele bolo de milho douradinho, molhadinho e pensei, não vou comer mais mesmo, então deixa eu aproveitar e comer mais um pedacinho... marido fez o mesmo... que desaforo. Mas o bacon, ahhh esse eles devoraram!

O jogo voltou, os canadenses continuaram a torcer educadamente, fazendo algumas piadinhas, palhaçadinhas e comentários mas nada de gritos ou xingamentos, nada muito caloroso ou emocional... o jogo acabou, o Canadá ganhou de 2 a 0, ouro olímpico para a paixão nacional dos canukes. E o que aconteceu?




Sim, aplausos meus amigos, os 10 torcedores naquela salinha aplaudiram ao final do jogo. Um coisa contida, educada, singela, porem animada...

Mas não vamos generalizar, né povo... nem todo mundo é igual, tem canadense animado por aqui também, que inclusive desafiam a gravidade e se jogam nos braços da emoção:




Quem aí se lembra do prefeito figura de Toronto?

E o jogo terminou, decidimos ir para casa, peguei meu paninho de prato de volta, olhei pro meu bolinho que sobrava quase que todinho ali na mesa e fui me embora.





Confesso que fiquei tristonha, achei que nego iria se esbaldar com nosso bolinho. Será que bolo não faz parte do ritual matinal do café da manhã canadense? Saí de lá com um espírito de Scarlett O'Hara incorporado na minha pessoa jurando nunca mais fazer bolo pra nenhum evento mais, que da próxima vez eu levo biscoito Maria e pronto.




Exageros totais da minha parte, eu digo que valeu a experiência, foi muito interessante assistir ao jogo com os locais e observar tudo de perto, fez me sentir parte da sociedade, e isso pra gente que está aqui sem os amigos e a família é muito importante. Aprendi muitas coisas sobre a cultura local, e isso não tem valor que pague. Bom, quer dizer... ainda falta aprender mais sobre café da manhã.... rsssss
Os jogos olímpicos de inverno de 2010 foram em Vancouver. Era fevereiro, mas precisamente entre os dias 12 e 28. Eu trabalhava home office e tive a oportunidade de assistir aos jogos pela tv. Assisti tudo, da cerimônia de abertura e minha modalidade favorita, a patinação, até aquelas que eu não entendia absolutamente nada, como o Curling e Hockey. Adorava muito quando falavam alguma coisa sobre Vancouver ou sobre o Canadá. Eu via todo aquele frio, aquelas paisagens de cartão postal e não podia deixar de pensar em estar lá.

Não pode haver tempo mais quente do que Janeiro e Fevereiro no Brasil, imagine então eu naquele calor escaldante de fevereiro vendo aquela paisagem toda coberta de neve branquinha e sonhando com o Canada. Até então o frio mais frio que eu conhecia vinham de portas... ou da porta do banco, ou da porta da geladeira... hahahahahahahaha e naquela época aquele frio congelante me parecia, (vejam bem, eu disse, pa-re-cia) a coisa mais maravilhosa do mundo!

O ano de 2010 me trouxe muitas coisas, coisas que mudaram muito o meu ano de 2011. E foi em Fevereiro de 2011 que eu então descobri o que era o frio. Chegamos dia 15 de fevereiro, e pela janelinha do avião eu olhava, eu via, mas eu não acreditava. Era tão novo pra mim, tão bonito... eu perguntava, aquilo ali na pista é neve? Quando eu penso naquele dia, uma sequencia de imagens vem a minha memória, mas elas não correspondem a um tempo e espaço normal, eram muitas informações novas ao mesmo tempo, e tudo passa numa outra velocidade. Eu havia deixado minha casa há pouco mais de 24 horas, num sol Colatinense escaldante de quase quarenta graus, e chegado a uma terra cinza e branca de -19. Menos. Negativo. O que era aquilo?

Passa no banco, pega as malas, veste o casaco, compra a passagem do metro, colocou a ceroula? Procura o endereço, pergunta o endereço, pega a escada rolante, saí na rua, é a rua errada, confere no mapa, procura a luva, cadê a luva????

Descemos na estação certa do metro, mas saímos do lado errado, e tivemos que andar uma quadra a mais de distância. Parece um problema se fizesse isso no Brasil? Não né... pelo menos pra mim não pareceu. Peguei a minha mala, subi as escadas rolantes, e tarammmm: primeira barreira da nova vida, deslizar as rodinhas dos 24kgs de mala sobre os 20 e tantos centímetros de neve que cobriam a calçada. Uma quadra a mais. Na metade do caminho a mão começou a doer. Largamos a mala na neve, corremos para a entrada de um prédio e, ó Deus, obrigada por ter um aquecedor bem aqui...  Continuamos tentando puxar a mala pela neve, definitivamente rodinhas de mala foram feitas para o piso lisinho e lustroso do aeroporto, e só.

Mesmo com aquele frio congelando, com a dificuldade de arrastar a mala sobre a neve e todo o nervosismo que atravessava meu coração, eu não podia acreditar no que estava acontecendo comigo. Alguns arbustos cobertos de neve pelo caminho e isso era encantador, eu queria tocar, mas quando eu parava, parece que os dedos doíam mais... Estamos no Canadá!

Chegamos no sujinho, e assim começou a nossa história...
(e se você não sabe o que é o sujinho nem como começou essa história, clique aqui).

Jogos Olímpicos de Inverno de 2014,  Sochi. Aqui estou eu novamente, assistindo minha modalidade favorita, e torcendo muito para o Canadá! Aqui estou eu no Canadá! Entendo melhor o Hockey e esse tal de Curling (que eu prefiro pensar que é uma modalidade mais refrescante do jogo de Bocha do meu pai...). E agora assistindo e sentindo frio! E ironicamente, com saudade do calor...

Acho que nunca mais vou assistir um campeonato mundial da mesma forma. Hoje quando eu vejo um atleta ou um time de um país como Uzbequistão ou Azerbaidjão, eu me lembro de alguém que eu conheci. Sempre tem alguém de algum lugar que eu nunca imaginei que conheceria... coisas que só o Canadá pode te proporcionar...

Foram 3 anos, quanta coisa mudou na minha vida, quanta coisa eu aprendi, quanta coisa eu vivi. Foram mesmo só 3 anos? Parece muito, parece pouco... Parecem 3 anos muito bem vividos! Essa é a minha experiencia, a experiencia que eu vou levar por toda a minha vida. todas as dores, todas as alegrias, todas as idas e vindas. É por isso que eu mereço, é por isso que eu brindo, é por isso que eu digo: Parabéns para mim. Parabéns pelos meus 3 anos de Canadá!